Feira do Camarão abre debate sobre os desafios do setor

Aproximadamente 10 mil pessoas são esperadas na Fenacam 2012, Feira Nacional do Camarão, que começa amanhã, segunda feira, no Centro de Convenções, em Natal. A organização do evento espera reunir os maiores produtores de camarão do mundo e colocar em debate os desafios do setor para os próximos anos, além dos fatores que impedem que o Brasil, um dos principais pólos de produção, possa crescer ainda mais no segmento. 
Rodrigo SenaProdução de camarão no Rio Grande do Norte: o Estado se destaca na atividade e busca novos mercados
Produção de camarão no Rio Grande do Norte: o Estado se destaca na atividade e busca novos mercados

"Será a nona edição da Fenacam, que este ano inovará em vários sentidos e incluirá os seguintes segmentos de forma independente: IX Simpósio Internacional de Carcinicultura; VI Simpósio Internacional de Aqüicultura; IX Feira Internacional de Serviços e Produtos para Aqüicultura e, o IX Festival Gastronômico de Frutos do Mar", diz Itamar Rocha, presidente da ABCC, Associação Brasileira de Criadores de Camarão.

O evento tem como objetivo apresentar e realizar, nos diversos segmentos que a integram, uma programação atualizada, diversificada e focada nas demandas técnicas e mercadológicas atuais de toda a cadeia produtiva da aqüicultura brasileira, com enfoque especial para a carcinicultura, a piscicultura e a malacocultura. 

"Teremos uma série de palestras interessantes. Para se ter uma ideia o evento receberá representantes de 85% da cadeia produtiva mundial. Teremos empresas do mercado chinês que faturam mais de 2 bilhões de dólares por ano com a carcinicultura. Mas é necessário também citar que este não é um evento voltado apenas para o camarão. A aquicultura está envolvida de forma geral. São mais de 20 países com representação. São 42 palestrantes, sendo 20 estrangeiros", completa Itamar Rocha.  

O público principal será composto por produtores e personagens da cadeia produtiva, desde o laboratório, fornecedores de insumos, fazendeiros e até revendedores e frigoríficos. Hoje, o mercado do camarão no Rio Grande do Norte gera em torno de 22 mil empregos diretos e indiretos. 
Bate-papo

Orígenes Monte, Pte. da Assoc. dos Criadores no RN

Na programação da Fenacam há um destaque para os fatores que impedem o Brasil de crescer nesta área. Que fatores são esses? 

Nós temos uma severidade terrível em todos os setores de produção. Se compararmos com o oriental nem se fala. A nossa legislação ambiental, os juros bancários, as questões trabalhistas, todos esses fatores são desfavoráveis à competitividade no mercado internacional. As condições naturais nós temos, o que nos amplia a possibilidade de produzir um camarão extremamente qualificado. O valor agregado é o principal foco de investimento hoje, já que não conseguimos competir em escala produtiva. Os chineses produzem em uma escala incomparável, que nós não temos como competir. Por isso o investimento em qualidade é fundamental para nosso setor. 

As palestras focam neste sentido?

Esse simpósio traz especialistas de primeira linha em relação ao combate as pragas que atacam o camarão, por exemplo. O principal órgão do produtor é o bolso e temos que ter cuidado com a importação de doenças para o nosso camarão. Nós temos hoje uma barreira sanitária que impede que as mais de 200 doenças que atingem o camarão asiático chegue às nossas fazendas. Mas há um risco constante que esta barreira seja quebrada, o que seria extremamente prejudicial ao produtor. Seria a eliminação completa do setor.  

Quais as perspectivas do setor para o futuro?

As perspectivas são as melhores possíveis, desde que apostem na aquicultura conforme a importância que o setor tem para o mercado. Veja só, estamos falando do maior agronegócio mundial, que é o da pesca e aqüicultura e que o Brasil tem excelente potencial de mercado para crescimento alem recursos naturais em quantidade e qualidade. Este setor, o de pescado, é nove vezes maior que o da carne bovina, sete vezes maior que o de frango e duas vezes maior que o gigante negócio internacional da soja. O brasileiro consome menos de 9 kg de pescado per capita/ano, quantidade inferior ao mínimo recomendado pela OMS, 18  kg, e bem distante dos principais países europeus. Portugal, por exemplo, 65kg per capita/ano.

ENTREVISTA

RICARDO PEDROZA, GESTOR COMERCIAL DA POTIPORÃ

"Não enxergo perspectiva de exportação. Enxergo o mercado interno"

Renata Moura - editora de Economia

A Potiporã Aquacultura, empresa do grupo Queiroz Galvão que já ostentou o título de maior exportadora de camarão do Rio Grande do Norte, projeta para este ano um crescimento de 250% na produção e de 40% ou mais nas vendas, em relação ao ano passado. O impulso é esperado de um mercado consumidor que desperta cada vez mais o apetite dos investidores: o Brasil. "Não vejo perspectiva de exportação. É no mercado interno que estão as oportunidades de crescimento", diz o gestor comercial da companhia, Ricardo Pedroza, que também é executivo das empresas 3 M empreendimentos, Camarave, Aquadelta e Compescal, com atuação no Rio Grande do Norte e no Ceará, no setor.  

No caso da Potiporã, o crescimento é esperado após praticamente dois anos de pausa na produção e de retomada em dezembro de 2011. A lacuna na operação da empresa foi aberta por enchentes que atingiram o Vale do Açu, região Oeste potiguar, entre 2008 e 2009. À época, a fazenda de criação de camarão instalada no município de Pendências ficou com 70% dos viveiros submersos e, segundo informações divulgadas no período, dispensou mais de 3 mil trabalhadores.  

Nesta entrevista à TRIBUNA DO NORTE, concedida por telefone, Ricardo Pedroza evita relembrar as turbulências, mas fala sobre o renascimento da empresa, sobre novos investimentos para atender a demanda e sobre a força do mercado interno, que absorve 100% da produção nacional, hoje. Parte desses assuntos serão abordados pelo executivo na próxima quarta-feira, dia 13, em palestra no 9º Simpósio Internacional de Carcinicultura. O evento integra a programação da Feira Nacional do Camarão (Fenacam), que começa amanhã e vai até 14 de junho no Centro de Convenções de Natal. 

Na palestra, Pedroza vai falar sobre comercialização, tendências do mercado interno e perspectivas para exportação cuja retomada, observa ele, será "difícil". O executiva mostra uma prévia do que pensa, a seguir:

O que estimula a Potiporã retomar a atividade depois dos prejuízos que sofreu e em meio a um cenário desfavorável às exportações?

O grupo (Queiroz Galvão) fez um investimento grande lá atrás na fazenda, na indústria de beneficiamento e no laboratório (de produção de pós-larvas de camarão). É um grupo que acredita na produção. E que enxergou o mercado interno demandando bastante produto. O mercado interno foi uma grata surpresa e em que já vinhamos acreditando antes da cheia. Quando o grupo percebeu que os meios de cultivo, que o meio ambiente estava interessante para voltar a produzir, que as larvas de camarão estavam dando boa resposta em termos de  sobrevivência, decidiu fazer mais uma aposta no setor. Houve um conjunto de fatores do ponto de vista de produção contribuindo para isso. 

Quando foi tomada a decisão de retomada?

A retomada da fazenda foi feita aos poucos e começou no final de 2010. No final de 2011 a fazenda voltou a estar toda povoada.  Em dezembro de 2011 foi retomada a a indústria de beneficiamento. Foi preciso recontratar mão de obra, recuperar equipamentos. A Potiporã tem uma área de produção de 960 hectares. É a maior do Brasil. E espera produzir 3,5 mil toneladas de camarão este ano. Tem também uma indústria em Pendências, que esteve  fechada por dois anos e hoje emprega em torno de 160 pessoas (chegou a empregar 400). O grupo está acreditando de novo na atividade. Está expandindo.  Está fazendo investimento na indústria, implantando uma linha de cozimento, investindo na área de automação. Está investindo  na ampliação de produção de pós-larvas em laboratório. A empresa arrendou um novo  laboratório em Pernambuco. Vai ter então um segundo laboratório produzindo pós-larvas, em função do crescimento da demanda de mercado por melhoramento genético, uma área em que a empresa não parou de trabalhar nem de investir mesmo após as enchentes. A empresa está viva e acreditando na atividade.  

A Potiporã já foi uma das maiores exportadoras do Estado. Como a empresa vê o mercado externo hoje?

O motivo principal de a gente ter deixado de exportar é o câmbio. Se fizermos um paralelo e pegarmos o preço do camarão multiplicado por R$ 2,80, há sete, oito anos, e hoje multiplicado por R$ 2, vamos ter uma diferença de preço assustadora. O fator principal da não exportação, da busca por novos mercados, é esse. Foi uma questão de preço real. Infelizmente o preço que a gente trabalha lá fora é muito baixo. É muito abaixo do que a gente consegue vender hoje no mercado interno.

Qual é a diferença?

O preço no mercado interno é de 15% a 20% maior do que se conseguiria no mercado europeu, onde nós atuávamos com mais força.

Especialistas não veem muita perspectiva de o dólar ter uma supervalorização. O mercado externo está morto?

Uma coisa interessante é que quando surgiram projetos de camarão em 2000, 2002, todo esse camarão produzido tinha como propósito a exportação. Não existia mercado interno. A produção  chegou a 90 mil toneladas/ano e aos poucos o camarão foi sendo redirecionado para o mercado interno. Hoje, 100% está no mercado interno. Acho difícil a volta da exportação. Porque existe um compromisso assumido com os clientes no Brasil. 

Na sua visão é impossível manter os dois mercados? A produção não é suficiente para isso?

Tudo o que a gente produz no Brasil é vendido no Brasil. A produção não é suficiente para exportar. Se for exportar vai faltar camarão no mercado interno. A não ser que haja novos investimentos em fazendas, em produção, e em eficiência. Mas não enxergo perspectiva de exportação. Enxergo perspectiva de crescimento no mercado interno. Estão sendo feitos investimentos para melhorar a produção, em laboratório, para melhorara a qualidade genética, investimentos nas indústrias para adaptar os produtos ao que o mercado nacional demanda.  Todas as empresas estão fazendo investimentos para ampliar a  produção, mas o foco é atender a demanda do mercado interno. 

Você representa empresas que atuam no Rio Grande do Norte e no Ceará. Concorda com declarações de outros setores de que o Ceará está à frente do RN porque tem incentivos mais agressivos e infraestrutura melhor? 

No caso do camarão, o governo do Rio Grande do Norte é parceiro do setor. O setor não tem do que reclamar do ponto de vista de incentivo. Do ponto de vista de infraestrutura há uma coisa em que o governo peca. Toda a região de Pendências onde está a Potiporã e você deve ter algo como 2.500 hectares de fazendas de camarão (se consideradas outras empresas), fora a fruticultura, as salinas, o petróleo, está a mercê, todos os anos, da cheia. A gente não vê o governo se mexer para conseguir verba do governo federal, para fazer barragem de contenção para acabar os prejuízos. Você tem uma atividade que produz, que é caríssima, que fica todo ano no risco de se vai ter cheia ou não. É uma coisa que desanima. 

Qual é a projeção de crescimento para o mercado interno este ano? 

Nossa operação deve crescer este ano 40% em relação ao ano passado (considerando o grupo de empresas que representa). No caso da Potiporã o crescimento deve ser maior, já que no ano passado a empresa produziu bem menos. O setor, de forma geral, deve crescer uns 30%. 

O que está puxando o crescimento? Tem a ver com queda de preço? Com ganhos de renda da população? 

No passado, a qualidade do camarão no Brasil era duvidosa e o preço alto. Com a popularização do camarão de viveiro as pessoas deixaram de enxergar o produto como intangível. Todas as classes sociais compram. 

Quais seriam os desafios do setor, diante desse novo mercado?

Ter um camarão mais industrializado. De 35% a 40% do camarão é vendido in natura, fresco, no viveiro. Isso atrapalha o setor e alimenta também um mercado muito informal. Também vejo como desafio aumentar a produção para garantir a regularidade do fornecimento. 

Retomada

A Potiporã, que chegou a  produzir 6 mil toneladas de camarão por ano, em 2011 registrou uma produção próxima a 1 mil toneladas. Este ano, a expectativa é produzir 3,5 mil toneladas, o que representaria um avanço de 250%. "Este ano é de retomada", diz Ricardo Pedroza. Ele estima que em dois anos a empresa poderá retomar o  auge da operação. "Mas isso vai depender de investimentos", acrescenta, confirmando, sem mais detalhes, que o grupo Queiroz Galvão também projeta investimentos em energia eólica no RN e no Ceará. 

Na carcinicultura, o possível crescimento da empresa deverá ajudar a robustecer os resultados do setor no Rio Grande do Norte e no Brasil. De acordo com estimativas da Associação Brasileira de Criadores de Camarão, a produção potiguar deverá alcançar até 30 mil toneladas este ano, com crescimento de 30,43% em relação ao total estimado para 2011, em torno de 23 mil toneladas. Em relação ao Brasil, a entidade calcula a produção de 75 mil toneladas, um aumento de 5 mil toneladas em relação ao ano anterior.

No caso da Potiporã, o volume deve ser destinado exclusivamente ao mercado interno. Nem sempre foi assim. Dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), mostram que a empresa exportou US$ 11,45 milhões, em 2004. Foi o maior valor exportado por empresas do setor no perídoo. A partir de 2005, porém, foi ultrapassada pela Camanor e permaneceu na segunda posição entre as exportadoras até 2007. A partir de 2008 não há registro no MDIC de que a Potiporã tenha exportado.
Fonte: TN Online

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